Intervenção Entre (Site-specific) em dezembro de 2004 no Sílvia Matos Ateliê de Criatividade

Em dezembro de 2004, o jardim do Sílvia Matos Ateliê de Criatividade estava sofrendo uma reforma e o Antropoantro aproveitou a ocasião para fazer sua intervenção Entre (Site-specific).

 

Comecemos apresentando o documento lançado na época sobre esse evento.

 

ENTRE
(site-specific)
 
 “os monumentos, como os jardins e as ruínas, são construções que existem no limite da utilidade e da permanência. Eles flertam com o desaparecimento.”     Nelson Brissac
 
Chão de terra, telas brancas...criando uma espécie de labirinto em que as pessoas caminham o tempo todo escolhendo seu roteiro. “A qualidade labiríntica consiste em cultivar ambientes urbanos mesclando interior e exterior. Esta multiplicidade de urbanização como a criação de um sentido interior de complexidade inescapável, de um labirinto interior como o museu na Gare d’Orsay reformulada de Paris”. (David Harvey - Condição Pós-Moderna)
 
A obra não exige contemplação mas uso, busca. Não é o olhar viciado, mas novas atitudes que determinarão a relação com o objeto de arte. “A arquitetura passa a explorar o entre as coisas - as passagens. Estas  não num extremo ou noutro, mas no meio. Contra a tradição do monumental - do eterno e do estático - assimilar a fluidez dos sistemas de comunicação. Uma “arquitetura do entre”. “(...) estar entre significa estar entre algum lugar e nenhum lugar. Estar entre implica buscar um ‘atopos’, a utopia dentro do ‘topos’.” (Nelson Brissac).
 
“A idéia de passagem é uma obsessão da escultura moderna” segundo Rosalind Krauss. “A imagem da passagem serve para colocar tanto o observador como o artista diante do trabalho e do mundo, em uma atitude de humildade fundamental a fim de encontrarem a profunda reciprocidade entre cada um deles e a obra”. (Rosalind Krauss)
 
Mas a passagem pode estar barrada sob a forma de um portal negro que nada deixa passar ... ou disponível em brancas escadas. De passagem pode-se topar com um tótem primitivo, provisório na aparência mas que resiste a tempestades.
 
”(...) o estranhamento inquietante seria sempre algo em que, por assim dizer, nos vemos totalmente desorientados. Quanto mais um homem se localiza em seu ambiente, tanto menos estará sujeito a receber coisas ou acontecimentos que nele produzem uma impressão de inquietante estranheza.” (Freud) Mas o homem localizado firmemente e não passível de inquietação ainda está por nascer ...

 

O Grupo Antropoantro apresenta sua mais recente obra: ENTRE, site-specific (obras realizadas específicamente para determinados lugares - ruínas, espaços abandonados ou construções que sofrerão transformações). As artistas do grupo pesquisam esse assunto há alguns anos, e sempre que a oportunidade surge, executam um site-specific. No presente caso, a área externa (jardins) do Sílvia Matos Ateliê de Criatividade passava por uma reforma. O Grupo apropriou-se desse espaço em transformação  e fez dele um site-specific que foi aberto ao público um único dia - 12 de dezembro de 2004 das 16 às 21 horas. O público era convidado a participar dessa obra por ser parte ativa da mesma.

 

Agora veremos algumas imagens desse evento.

 



 




 

Um fato que merece ser lembrado é o nascimento da Escultura Que  Não Deu Certo,  também conhecida como Homem de Plástico ou Joaquim. Depois de um trabalho manual de preparação dentro do Ateliê, o grupo acabou preparando seu surgimento aflorando na terra do Site-specific. Veja imagens desse nascimento e os meandros dos caminhos a percorrer para sair dali.

 

 




 
 

Vejam um recorte de jornal noticiando o evento na época.

 


 

Transcrevemos o texto dessa  reportagem.

 

Texto de Paula Ribeiro no Caderno C, Correio Popular, 12 de dezembro de 2004

Cinco horas. Este é o tempo de duração da obra  Entre, montada no jardim da casa da artista plástica Sílvia Matos, que passa por reforma. Provocativa e diferente, a obra relâmpago é uma concepção de seis das onze artistas que integram o grupo Antropoantro e estudam intervenções urbanas há alguns anos.

Revoltadas com o fato de nunca terem conseguido permissãopara realizar uma intervenção urbana na rua - que seria mais condizente -,  BethSchneider, Inês Fernandez, Lalau Mayrink, Vane Barini, Walma Lina e Sílvia se contentaram em fazer no jardim de 350 metros quadrados de área.  “Descobrimos que o território livre não  é tão livre assim e tivemos de nos limitar com este espaço, já que nunca conseguimos permissão para realizar tais intervenções nas ruas” comentam.

De acordo com as artistas, esta obra é um site-specific, ou seja, uma instalação realizada especificamente para determinados lugares que duram um período definido previamente.

Cem metros de uma tela plástica branca reticulada formam um labirinto ao longo do jardim. A trilha delimitada pela  tela é desviada do deck propositalmente, obrigando os  visitantes  a entrar em contato com o chão de terra, que leva ao conjunto que forma a obra.

Um portal está pintado na cor preta no muro para quem quiser se arriscar a entrar; assim como o buraco negro cuidadosamente no chão. O visitante pode ser surpreendido ao se deparar com um criativo totem construído com placas de grama que foram retiradas do jardim (e que  insistem em sobreviver para  a alegria das artistas); uma convidativa escada branca; e um gigantesco homem de plástico, que pode causar espanto ou estranhamento em quem imagina que ele está enterrado vivo ou uma ponta de alegria para aqueles que pensam que ele está brotando do chão.Mas uma coisa é certa: ninguém sairá da exposição como entrou porque, no mínimo, ela irá causar uma ponta de questionamento sobre  os novos rumos da arte.

A tela branca, que separa os visitantes das árvores frutíferas do jardim, estimula a criatividade e toma forma de verdadeiras pinturas com a projeção das sombras das árvores, dependendo do horário do dia. Além disso, por permitir que se enxergue o outro lado, conforme o visitante se aproxima, a tela instiga os mais curiosos a saber o que há por detrás, trazendo à tona o voyeurismo presente em cada indivíduo. E, surpreenda-se: obras de arte podem ser encontradas.

“Demos o nome de Entre porque a palavra tem dois significados que buscamos: a preposiçao, que indica o intervalo que separa as coisas, e o convite para as pessoas se lançarem nessa aventura”  explica Sílvia.

Como toda obra de arte, o olhar de cada visitante encontrará os diversos significados sugestivos de cada detalhe da efêmera instalação. “A obra não exige contemplação, mas uso e busca. Não é o olhar viciado, mas as novas atitudes que determinarão a relação com o objeto de arte” sentenciam as artistas no material divulgado cheio de definoções para os caminhos, labirintos, entradas e saídas do espaço.

“O público está convidado a participar dessa obra pois ele é parte ativa da mesma” são as palavras do convite. Portanto, leitor, só há uma palavra a instigá-lo a conferir as sensações ao contemplar tal exposição, que mal pode ser transposta em palavras: entre.






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